O Sistema de Seguridade Social nasceu da necessidade de o Estado proteger os indivíduos dos riscos sociais e dos eventos que pudessem causar dificuldades ou impedimentos de garantir sua própria subsistência através do seu trabalho, sendo uma das funções primordiais do Estado Contemporâneo.
[1]
O Brasil estabeleceu regras de caráter geral em matéria de previdência social apenas no início do Século XX.
[2] Essa demora foi provocada por dois motivos principais: o atraso do Brasil em termo de regimes políticos e a peculiar relação entre o Estado e a sociedade civil.
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Daniel Machado Rocha em sua obra “Direitos Fundamentais, Democracia e Cláusulas Pétreas”, destaca ainda que os partidos políticos brasileiros eram regionais e oligárquicos, arraigados no modelo de clientelismo rural e que inexistiam camadas médias da população brasileira engajadas politicamente, o que inviabilizava a formação e atuação de uma sociedade civil organizada e politicamente ativa.
No ano de 1923, era publicada e entrava em vigor a Lei Eloy Chaves que inseriu no ordenamento pátrio um verdadeiro sistema de previdência social, tendo acolhido os princípios do caráter contributivo e do limite de idade dos sistemas previdenciários. Esta lei criou as Caixas de Aposentadoria e Pensões nas empresas de estradas de ferro, mantido através das contribuições dos trabalhadores e garantia a eles aposentadoria e pensão, em caso de morte, aos seus dependentes, assistência médica e desconto em remédios.
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No ano de 1930, após apenas sete anos de sua institucionalização, a previdência nacional sofria seu primeiro golpe, quando o então presidente Getúlio Vargas suspendeu pelo período de seis meses o deferimento de todas as aposentadorias, motivado por denúncias de inúmeras fraudes e corrupção.
A década de 30 do Século passado, apesar da primeira crise apontada acima, trouxe importantes transformações no âmbito dos Direitos Sociais. A
Constituição de 1934 trouxe pela primeira vez um capítulo que tratava especificamente sobre a ordem econômica e social, atribuindo ainda deveres para o Estado
[5]. Esses benefícios seriam custeados por meio de contribuição dos trabalhadores, em conjunto com os empregadores e do Poder Público.
Maria Luiza Amaral Rizotti, em seu estudo “A construção do sistema de proteção social no Brasil: avanços e retrocessos na legislação social” defende que os benefícios trazidos neste
texto constitucional “além de manifestamente assistencialistas, eram correntemente utilizadas como instrumentos de controle e repressão das reivindicações por melhores condições de vida promovidas por segmentos organizados da classe trabalhadora”
[6]
No ano de 1937, apenas três anos após sua entrada em vigor, a
Constituição de 1934 foi retirada do nosso ordenamento, por oportunidade do golpe de Getúlio Vargas que deu início ao período conhecido como “Estado Novo”, promulgando uma nova
Constituição. A nova
Carta Magnatrouxe consigo um enorme retrocesso para os direitos sociais, com diminuição do direito à educação, além de o Estado ter aumentado o seu controle sobre os sindicatos e ter criado a competência dos governos regionais e locais na atuação de políticas sociais. Tais medidas, segundo Maria Luiza Amaral Rizotti resultaram “em uma grande centralização de ações ao ponto de restar aos municípios tão somente a administração de cemitérios, restando como alternativa legítima para manifestação das demandas populares somente as ligas de bairros”
[7]
Do fim do Estado Novo até o Golpe Militar de 1964 predominou em nosso país a política populista, especialmente no que tange aos Direitos Sociais trazidos pela
Constituição de 1946, que trouxe mudanças quanto a Ordem Econômica e Social, ampliando o entendimento de que o Estado era protagonista na busca do desenvolvimento econômico e da justiça social, que deveriam caminhar em conjunto.
Valioso o entendimento de Maria Luiza Amaral Rizotti, segundo o qual “ao analisarmos as características fundamentais dos governos populistas, compreendemos o motivo pelo qual estes governos apresentavam dificuldade na incorporação efetiva das reivindicações populares de maior profundidade. Isto se devia, fundamentalmente, ao fato de que no contexto do populismo, a ação política institucional orientava-se pela expansão pontual de benefícios sociais, sem que tal expansão consistisse realmente no reconhecimento de novos direitos sociais, ou sequer no estabelecimento de políticas duradouras. Assim, se por um lado a instituição de novos benefícios na legislação social da época constituía-se padrão de manejo da questão social pelo Estado Democrático - até mesmo contribuindo essencialmente para sua legitimação - por outro, não assegurava a transição para uma legislação social renovada no país, reforçando o caráter seletivo pelo qual havia se caracterizado historicamente o conjunto das políticas sociais brasileiras”
[8]
No final das contas, embora superasse a tradicional resposta da força repressiva para as demandas sociais da população, a forma de tratamento da questão social pelos governos democráticos populistas, veio acrescentar-lhe uma das características determinantes da questão social no Brasil, a saber, o caráter corporativo da expansão destes em nosso país. Devemos ressaltar, porém, que tal característica não surgiu nas políticas sociais brasileiras a partir do período populista, estes remontam ao período da ditadura de Vargas, conhecido como “Estado Novo”.
Com o Golpe Militar de 1964 alterou-se substancialmente as políticas sociais, que objetivavam, de maneira velada, a restrição da participação dos movimentos populares provocando uma expressiva centralização das políticas de desenvolvimento social do país nas mãos do Estado. Maria Luiza Amaral Rizotti entende que “o novo padrão de políticas sociais do país reproduziria muito do que havia de pior nos modelos que o antecederam. Sobretudo a seguridade social seria organizada com forte caráter assistencialista. Além disso, os serviços criados ou encampados pelo governo federal tornar-se-iam progressivamente mais seletivos, restringindo-se o atendimento da população e confiando-se parte expressiva dos serviços a iniciativas filantrópicas. De modo geral, foi regra no período a redução ou negação de direitos estabelecidos na legislação, ora por força da crise financeira da previdência social, ora como efeito dos modelos privatizantes realizados na saúde, ora pelo descaso aberto do Estado em relação aos excluídos do sistema formal previdenciário”
[9]
Um dos fatos que mais demonstra essa elevada centralização e controle das políticas dos Direitos Sociais foi, em 1967, a unificação da Previdência Social, surgindo o Instituto Nacional de Previdência Social e a transferência dos recursos do INPS para o Tesouro Nacional, e provocando a confusão dos orçamentos e dos objetivos da política previdenciária, com a consequente redução da efetividade na aplicação dos direitos sociais, o que não ficou no passado, como será mostrado mais adiante.
Inúmeras mudanças ocorreram desta data até a promulgação da
Constituição Federal de 1988 que, finalmente, elevou a Seguridade Social ao patamar que esta merece. Ademais, a Previdência Social é uma das políticas que o Estado tem o poder-dever de garantir para a sociedade, estando acolhido
Constituição Federal de 1988, em seu artigo
6º, que regulamenta e insere em nosso ordenamento o Sistema de Seguridade Social. Por meio deste dispositivo, inserido no Título II “Dos Direitos e Garantias Fundamentais”, a Constituinte de 1988 reconheceu os direitos sociais, incluindo a Previdência Social e todos os institutos que fazem parte, como direitos fundamentais, devendo-se aplicar a estes todas as suas premissas.
No ano de 1990 o Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS) foi criado e no ano seguinte as Leis
8.212 e
8.213 foram publicadas, regulamentando, respectivamente, o custeio e os benefícios da Seguridade Social. Nos anos que seguiram, até a Emenda Constitucional
20 de 1998, várias reformas foram feitas com o principal intuito de evitar a alarmada “crise da previdência”. Tais reformas, em linhas gerais, se baseavam na redução dos direitos conquistados, mesmo sem que estes tenham sido efetivamente implementados.
Eu nasci em 27 de março de 1991, não vivi os momentos históricos e políticos descritos neste texto. Eu nasci sob a égide da “Constituição Cidadã” e vivi os anos “prósperos” do “Plano Real”. Vivi os “melhores tempos desta nação” e vi, de perto, a esperança de um país mais igual, onde os poderosos cuidariam dos carentes e realmente acreditei nessa promessa, assim como a maioria de nós.
Hoje, aos 24 anos, vejo que as políticas sociais e assistencialistas dos governos que se seguem no poder têm caráter nitidamente populista e eleitoreiro. Vejo que o orçamento da Seguridade Social encontra-se centralizado nas mãos da União desde o ano de 2007, quando, por meio da Lei
11.457, foi transferido para a Receita Federal do Brasil o controle de suas contas. Observo um Estado que alega ausência de recursos para implementação dos direitos sociais adquiridos para a população, mas que ao mesmo tempo desvincula 20% do orçamento deste para pagar títulos da dívida pública, como se existisse alguma dívida mais importante do que aquela com seu povo.
É fácil perceber que não existe uma verdadeira evolução quanto às políticas de proteção social no Brasil. O que se observa é, infelizmente, um ciclo vicioso com a aplicação de modelos ultrapassados que objetivam tão somente manter o controle dos movimentos sociais, impossibilitando que os Direitos Sociais sejam aplicados de maneira satisfatória.
[1]CASTRO, Carlos Alberto Pereira de; LAZZARI, João Batista.
Manual de Direito Previdenciário. 16ª edição. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2014. 3p
[2]CASTRO, Carlos Alberto Pereira de; LAZZARI, João Batista.
Manual de Direito Previdenciário. 16ª edição. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2014. 38p.
[3]Sobre os motivos, ressalto que no momento em que a Inglaterra e a Europa entravam no ciclo da Revolução Industrial o Brasil estava deixando de ser colônia, com economia baseada no latifúndio e no trabalho escravo. Ademais, destaco o fato de que, por conta do modelo de construção do Brasil como colônia, o Estado surgiu antes mesmo da formação da sociedade civil.
Postado por Carlos PAIM
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